Parque da Memória Buenos Aires monumento aos desaparecidos.
Memória e violência política
Os processos históricos que envolvem violência política são experiências matrizes para a construção de memórias sociais marcadas por apagamentos, rupturas simbólicas ou narrativas idealizadas em torno da ação dos protagonistas e grupos sociais envolvidos. Guerras, revoluções e ditaduras desencadeiam processos que, para além do impacto nas instituições e estruturas sociais objetivas, são marcados por narrativas memoriais que forjam as identidades dos envolvidos diretamente nas ações, bem como seus herdeiros culturais e políticos, diretos e indiretos. Grosso modo, a conexão entre os eventos e experiências matrizes e os processos memoriais posteriores têm como momento crucial a fase de reconstrução social e transição política pós-conflito. É neste momento que, geralmente, se constroem narrativas e memórias hegemônicas1 que podem perdurar por décadas após o fim dos eventos conflitivos. Frequentemente, essas narrativas hegemônicas têm a função de consolidar processos de transição política, estabilizando rearranjos institucionais e legitimando a atuação dos atores sócio-políticos em contextos de reconstrução social, trazendo em si as contradições, tensões e negociações inevitáveis em situações de pós-conflito e pacificação social. Além disso, essas narrativas memoriais catalisam processos culturais e sociais de assimilação, recalque e silenciamento das violências cometidas por perpetradores ou sofridas pelas vítimas dos conflitos. As justiças de transição, geralmente, se inserem nessa lógica de ação pós-conflitiva, procurando combinar a busca das responsabilidades sobre as violências cometidas (sobretudo por parte de agentes de Estado), estabelecer punições cabíveis aos perpetradores e propor formas de reparação das vítimas (Pinto, 2016).
No limite, se bem-sucedidos, esses processos de transição e justiça pós-conflito podem propiciar o exercício do perdão e o convívio social renovado, em um ambiente de paz social e democracia política (Hilb, 2014). Vale lembrar que o modelo de transição e justiça pós-conflito tem suas origens mais longínquas no Tribunal de Nuremberg que julgou os crimes de guerra e crimes de Lesa Humanidade praticados pela cúpula nazista derrotada na Segunda Guerra Mundial. A partir da década de 1970, o modelo de justiça transicional, esboçado pelos tribunais internacionais do pós-Guerra, disseminou-se em vários países e continentes, consagrado pelas práticas e doutrinas do Direito Internacional, inspirando a criação das Comissões da Verdade pós-conflito (Stan, 2014). Obviamente, cada sociedade nacional experimenta, igualmente, processos de transição e processos memoriais peculiares que não cabem em um modelo normativo único.
Aliás, foram os efeitos da Segunda Guerra Mundial que mudaram as formas de situar as vítimas e perpetradores nos processos memoriais. Até o Holocausto/Shoah, a vítima era vista como um mero efeito colateral das guerras, colocadas em segundo plano nas narrativas que enfatizavam os estadistas e heróis militares vitoriosos. A partir de então, tornou-se categoria central a ser pensada, reverenciada, memorizada, reparada. A forma de lembrar do Holocausto/Shoah que foi consagrada entre os anos 1960 e 1980, ao lado do culto heroico às resistências à ocupação nazifascista – reverenciadas no contexto europeu do pós-Guerra como imperativos éticos e não como meras opções políticas - tornaram-se verdadeiros paradigmas da memória dos conflitos políticos posteriores (Arendt, 2011). Os eixos dessa nova narrativa são a “vítima-inocente” e a “vítima-resistente”, inspirando uma nova ética e uma nova epistemologia para analisar os conflitos que envolvem violência massiva e generalizada. Para além do contexto europeu, esse novo modelo de narrativa, crítica histórica e memória social foi incorporado pelas lutas anticoloniais e antirracistas, adaptadas às lutas dos povos colonizados contra a dominação europeia dando nova compreensão às violências coloniais que já não podiam ser justificadas em nome do progresso e da civilização (Traverso, 2003; Losurdo, 2017).
O axioma geral brevemente resumido tem permitido aos historiadores engajados, e outros operadores da memória coletiva, formalizar e analisar processos de memória social que são muito fluidos. Por outro lado, devem ser cotejados com casos historicamente particulares e concretos, permitindo a compreensão crítica dos processos memoriais pós-conflito.
No caso das ditaduras militares latino-americanas dos anos 1960 e 1970, de caráter anticomunista, baseadas na Doutrina de Segurança Nacional, esses dois paradigmas de memórias do pós-Segunda Guerra foram decisivos para ressignificar a experiência histórica do autoritarismo e das graves violações dos Direitos Humanos perpetradas por estas regimes. Nos países em questão – Brasil, Chile, Argentina e Uruguai - os processos de transição, mais abruptos ou mais negociados e estendidos conforme o caso, foram importantes para a elaboração das memórias posteriores, pautando respostas institucionais e sociais à violência estatal baseada em ações paralegais de repressão estatal a opositores (ou seja, que se utilizaram de sequestro, tortura, execuções extrajudiciais e desaparecimentos forçados para combater opositores armados ou não).
As derrotas das organizações armadas de esquerda e a adesão de ex-guerrilheiros aos princípios da democracia formal na transição pós-ditaduras também ajudaram a ressignificar a experiência histórica, criando a figura da “vítima-resistente”, o militante de uma “causa justa” que morreu de maneira vil nos porões da tortura, consolidando uma agenda de Direitos Humanos e democracia (Marcarian, 2013). Essas derrotas, bem como os traumas causados nos sobreviventes pelo desaparecimento forçado de familiares e pela violência abjeta da tortura, constituem experiências matrizes fundamentais para as memórias sociais no Cone Sul, além de propiciarem um grande debate historiográfico sobre o papel das esquerdas na crise política que antecedeu os golpes de Estado, sobretudo no Brasil, no Chile e no Uruguai (Buriamo, 2011; Waldman, 2014). No caso argentino, a intensidade e a extensão das violências de Estado galvanizaram o debate acadêmico e social (Jelin, 2002, Catoggio, 2010; Caparros, 2013).
Os processos memoriais pós-ditadura, assim como os paradigmas de memória que os inspiraram, como a Shoah/Holocausto e a Resistência antinazista na Europa, não foram lineares no tempo, nem cumulativos, construindo-se por camadas narrativas que se sobrepõem e por descontinuidades no tempo. Em outras palavras, esses processos memoriais foram desiguais, experimentaram marchas e contramarchas, alternaram narrativas saturadas de lembranças com outras, organizadas a partir de elipses e silenciamentos. Tampouco, as narrativas hegemônicas foram aceitas por todos os protagonistas daquele período ou seus herdeiros político-culturais, sendo marcadas por questionamentos e demandas por revisões constantes.
Determinados momentos históricos pós-ditaduras do Cone Sul foram particularmente cruciais para consolidar narrativas de memória que se tornaram hegemônicas. No caso do Chile, a prisão de Pinochet em 1998 em Londres, por ordem do juiz espanhol Baltasar Garzón, exigiu um grande debate nacional e o reposicionamento de atores institucionais e militantes de direitos humanos em nome da exumação das memórias da ditadura, culminando no Relatório Valech (Ramirez, 2012). Na Argentina, além do grande impacto dos juicios das Juntas Militares nos anos 1980 que condenaram o alto escalão militar da ditadura, as revelações do militar Adolfo Scilingo, sobre os “voos da morte”, em 1995, e a recomposição das forças sociopolíticas na Argentina depois de 2003, com a consolidação do Governo de Nestor Kirchner, consolidaram uma contundente política pública de memória voltada para o “Nunca Más”, ampliando a punição aos perpetradores (Lvovich & Bisquert, 2008). O Uruguai, por outro lado, vivenciou debates sociais intensos, em diálogo com ações institucionais, que se alternam entre a exigência de punição e acertos de contas com os perpetradores a serviço da ditadura e a demanda por perdão e esquecimento (Buriamo, 2011). O Brasil, por outro lado, foi marcado por uma longa transição democrática, conduzida por setores civis moderados em diálogo com os militares, sem uma política contundente de investigação das violações de Direitos Humanos.
A afirmação de uma memória hegemônica: crítica e conciliação
O contexto brasileiro, de ditadura e pós-ditadura, experimentou semelhanças e diferenças com os outros países do Cone Sul. Embora inspirada pela mesma Doutrina de Segurança Nacional, a ditadura brasileira encontrou um meio institucional e político mais propício a aceitar soluções autoritárias em nome da ordem social e do anticomunismo. Assim, os militares brasileiros conseguiram adentrar de maneira mais bem sucedida no sistema político e jurídico, ancorando-se em todo um aparato legal e político que lhe dava certa aparência de normalidade institucional. Por exemplo, o Congresso Nacional ficou aberto a maior parte do tempo que durou o regime e as eleições legislativas foram realizadas com regularidade, mesmo dentro de um sistema político controlado e tutelado, que usava e abusava da censura e da repressão policial. Mesmo depois do Ato Institucional n. 5, promulgado em dezembro de 1968, considerado a peça legal mais autoritária e discricionária da ditadura, o regime se esforçou para mostrar-se como legítimo e legal a um só tempo, apoiando-se no grande sucesso do “Milagre Econômico” entre 1968 e 1973, que, paradoxalmente, coincidiu com o auge da luta armada de esquerda e da repressão paralegal (Ridenti, 2010; Reis Filho, 1989). A perda paulatina de apoio social que marcou o longo processo de “abertura política” da ditadura, entre 1974 e 1985, não foi suficiente para fazer com que os generais no poder fossem escorraçados do comando do Estado. Em outras palavras, não houve “colapso” da ditadura militar brasileira. O que se viu foi um jogo político complexo de pressões de movimentos sociais e contrapressões estatais, com vários mediadores políticos entre um e outro polo, que culminou na Lei de Anistia de 1979. Essa lei foi um evento capital que pautou a memória sobre a ditadura brasileira, e estabeleceu limites para a investigação e punição de violações a direitos humanos que até hoje não foram superados.
Carlos Zilio, Reina a tranquilidade, 1967.
Detalhe da obra, Acervo Pinacoteca Brasileira.
A Lei de Anistia foi aprovada em meio a uma grande mobilização social, incrementada em 1978, pelo movimento em favor da “Anistia, ampla, geral e irrestrita”, que envolveu, principalmente, militantes dos direitos humanos e familiares de mortos e desaparecidos. Para estes, a anistia deveria ser geral, sem restrições, acompanhada de punição aos torturadores, o que obviamente não aconteceu. Ao mesmo tempo, os parlamentares que apoiaram o projeto do governo, mesmo aqueles mais à esquerda, estavam dispostos a acatar o realismo político e aceitar a (auto)anistia dos militares como um passo essencial para a “pacificação social” e abrir caminho para uma transição para a democracia (Monteiro, 2016).
A Lei de Anistia não deve ser analisada apenas em sua frieza jurídica. Basicamente, ela definiu que os indivíduos que cometeram “crime político” estavam anistiados e poderiam voltar do exílio e se reinserir na vida política. Entretanto, o texto excluía os que cometeram “crime de sangue” (ou seja, os ex-guerrilheiros), ao mesmo tempo em que perdoava os “crimes conexos” (ou seja, os torturadores a serviço do Estado). Essa aberração jurídica acabou por se tornar um ponto de apoio para os discursos de conciliação e esquecimento proposto por liberais moderados que conduziram o processo de transição e militares, contra a exigência de investigação e punição a torturadores e assassinos, considerada pela direita como mero “revanchismo” da esquerda derrotada. Mesmo no campo da esquerda brasileira, a intensa mobilização social a partir de pautas econômicas e sociais do Movimento Operário a partir do final dos anos 1970 acabou por deixar em segundo plano as demandas por “verdade, justiça e reparação”. O futuro tinha mais apelo do que o passado naquele contexto de luta por democracia (Rollemberg, 2014). Tanto comunistas (duramente atingidos pela repressão), como grupos da Nova Esquerda que animava o movimento social e operário, principalmente o recém-formado Partido dos Trabalhadores, vislumbraram a possibilidade de reocupar os espaços políticos no contexto da “Abertura” política do regime militar, pós-1979.
Ao mesmo tempo, a luta armada do final dos anos 1960 era criticada como equivocada, isolada das massas e voluntarista por quase todas as vertentes de esquerda, iniciando um amplo debate historiográfico e político-social sobre a sua natureza e seu papel na história da ditadura (Angelo, 2014). Naquele contexto, muitos ex-guerrilheiros lançaram memórias autocríticas de grande sucesso editorial, demarcando a guerrilha como uma aventura quase suicida e voluntarista, marcada por contradições e autoritarismos que deveriam ser expurgados pelas novas esquerdas. Dois livros exemplares desta linha memorialística, particularmente, fizeram muito sucesso – O que é isso, companheiro?, de Fernando Gabeira, e Os Carbonários, de Alfredo Sirkis. Em ambos, a narrativa não é pautada pelo trauma individual e coletivo e suas consequências sociais, ainda que denunciassem a violência da tortura, a repressão e as mortes perpetradas pela ditadura. Ambos são livros altamente críticos em relação à luta armada do final dos anos 1970, reforçando a ideia de improviso organizacional, autoritarismo interno, romantismo inconsequente, ainda que a opção fosse justificada, ética e politicamente falando, como reação à ditadura. As memórias que ali se afirmavam, insuspeitas à medida que foram escritas por dois ex-guerrilheiros, adensaram o clima de revisão do passado e aposta no futuro da democracia incentivada por liberais, comunistas e pela nova esquerda petista, as três principais forças de oposição ao regime militar por volta de 1980. À medida em que o clima de liberdades públicas foi sendo paulatinamente reestabelecido pelo último governo militar do general João Figueiredo (1979-1985), com o fim da censura prévia, a liberdade partidária e a diminuição da repressão paralegal à base de sequestros e torturas, a luta por “verdade, justiça e reparação” foi sendo colocada em segundo plano, mantida basicamente por grupos de Direitos Humanos, que no Brasil ainda não tinham grande capilaridade social, e familiares de mortos e desaparecidos.
Os liberais, sobretudo após 1974, foram se afastando do regime militar, ainda que mantivessem pontes de diálogo pragmático com os governos da época e adotassem um tom moderado nos seus projetos de transição. Eram críticos, sobretudo da falta de liberdades públicas, da censura, da repressão paralegal, mas também do estatismo e do protecionismo econômico dos generais no poder (Fonseca, 2005). A militância do Partido Comunista Brasileiro (PCB) se aproximou dos liberais críticos do regime, na tentativa de constituir uma frente antiditatorial pelas liberdades democráticas, tendo que moderar o seu discurso em nome dessas alianças (Napolitano, 2014). Os intelectuais comunistas tinham grande capilaridade na imprensa e na mídia, e foram muito influentes no debate púbico da época, na produção cultural e jornalística, adensando e legitimando as memórias críticas do golpe e da ditadura que circularam amplamente nos jornais e revistas a partir do início dos anos 1980, ainda sob a vigência do regime militar.
Com a emergência da Nova Esquerda que culminaria na criação do Partido dos Trabalhadores em 1980, esta estratégia aliancista dos comunistas “ortodoxos” foi seriamente questionada, mas os pontos principais do debate eram a conquista de espaços políticos e de direitos sociais para a classe trabalhadora, sobretudo assalariados de classe média e o operariado. O debate sobre o passado entre os intelectuais e militantes da Nova Esquerda estava mais voltado para a denúncia genérica das violências da ditadura, para a violência policial cotidiana contra trabalhadores e para o acerto de contas com os supostos “erros” das esquerdas nacionalistas (comunistas e trabalhistas) no contexto do pré-golpe de 1964.
As perspectivas de recomposição do ambiente político voltado para o futuro e o debate dentro das esquerdas sobre os “erros políticos” do passado acabaram por se sobrepor às pautas voltadas para a “verdade – justiça – reparação”, cada vez mais restrita aos aguerridos - mas sem capilaridade social - grupos de direitos humanos e familiares de desaparecidos políticos que não aceitaram os termos da Lei de Anistia que sacramentou a impunidade a torturadores, mas não tinham força política e institucional para revertê-la. Se a Lei da Anistia era falha, o realismo político aconselhava as forças de oposição a aceitaram os termos da ditadura, ainda forte e com capacidade de ação política e vigor repressivo. As urgências da história futura acabaram por esvaziar, socialmente falando, as necessárias perlaborações dos traumas passados. Os parlamentares da oposição, pragmaticamente, acabaram apoiando a Lei de Anistia do governo, mesmo considerando-a limitada e criticando a autoanistia a torturadores embutida no texto. Muitas falas desses parlamentares também condenavam a guerrilha, embora matizassem sua violência como reativa à ditadura, e enfatizavam a necessidade de “pacificação” nacional (Monteiro, 2016). A “anistia possível” aceita pelos parlamentares e aplaudida pela imprensa liberal, muito longe da anistia ampla, geral e irrestrita exigida pelos movimentos sociais, criava um cenário que possibilitou a volta dos exilados e a inserção no sistema político de lideranças históricas perseguidas em 1964, como Leonel Brizola, líder trabalhista, e Luís Carlos Prestes, liderança do PCB.
O resultado destas novas forças políticas de oposição no campo da memória social foi a disseminação de um discurso crítico ao regime militar, mas ao mesmo tempo pouco atento aos traumas da ditadura e à necessidade de “acertos de contas” com a violência estatal como questão pública chave no processo de transição. Essas foram as bases do que eu chamo de memória hegemônica (Napolitano, 2015) sobre a ditadura - crítica e conciliatória a um só tempo - que se consolidou a partir de 1979. Em síntese, essa narrativa deslegitimava o golpe de 1964 e a ditadura que se seguiu, e a condenava em termos genéricos, mas ao mesmo tempo aceitava os termos de impunidade e autoanistia dos militares em nome do pragmatismo político. Além disso, também na chave da “conciliação”, evitou-se o isolamento político e moral dos grupos sociais e quadros individuais que apoiaram os militares no passado, facilitando a sua inserção institucional no novo contexto democrático que se avizinhava. A grande campanha pelas eleições diretas iniciada em fins de 1983, que colocou milhões de cidadãos nas ruas, mas acabou derrotada por uma manobra política do Congresso Nacional pressionado pelos militares, tampouco se traduziu em uma campanha pela denúncia das violências contra os Direitos Humanos e revisão da Lei de Anistia. No bojo da derrota das “Diretas-Já”, as oposições acabaram aceitando, sempre em nome do realismo político, participar das eleições indiretas tal como definidas pelas regras do regime militar. Tancredo Neves, um político liberal moderado, foi lançado como candidato à Presidência da República em 1984, e sua campanha foi marcada pelo tom de “conciliação” e “esquecimento”, em nome da democracia futura. Em seus discursos, Tancredo usava os próprios termos da direita militar, contra o “revanchismo” e pela “pacificação”, ainda que genericamente crítico ao autoritarismo do regime. Tancredo Neves foi eleito no começo de 1985, mas não chegou a tomar posse, falecendo de causas naturais após uma longa agonia de mais de dois meses, e causando uma grande comoção popular. O vice-presidente de sua chapa, José Sarney, um quadro civil oriundo do regime militar, recém-convertido à oposição liberal, acabou sendo o primeiro presidente civil do Brasil, reforçando a sensação de que seu governo seria um “continuísmo histórico” da ditadura. A bem da verdade histórica, Sarney não chegou a ser um mero fantoche dos militares, restabelecendo as plenas liberdades públicas e afiançando a convocação da Assembleia Constituinte (1986-1988). Mas é inegável que os generais ainda tinham poder político e poder tutelar sobre o governo Sarney, sobretudo de veto às revisões da Lei de Anistia e outros temas sensíveis.
A memória hegemônica sobre a ditadura não era necessariamente compartilhada pela maioria da sociedade, nem por grupos minoritários, politicamente falando, à esquerda e à direita. Por outro lado, foi amplamente sancionada pelos meios de comunicação, pela imprensa, pelo campo artístico, pelos movimentos sociais e sindicais, pelos operadores do direito e por intelectuais acadêmicos e literários, ou seja, pelos grupos que organicamente tinham influência maior sobre a esfera pública. Seu corolário era uma política de esquecimento institucional dos militares que viam a Lei de Anistia, fundamentalmente, como uma lei de esquecimento, condição primeira para a aceitação do governo civil pela caserna. Dentro das Forças Armadas essa espécie de pragmatismo político não foi aceita sem tensões, pois muitos grupos militares entendiam que as duras críticas ao golpe e à ditadura que passaram a vigorar na sociedade civil manchavam a “honra do Exército”, ainda que a linha vermelha da impunidade aos perpetradores não tivesse sido ultrapassada.
Antes de analisarmos as outras memórias que foram abafadas pela memória hegemônica - compartilhada sobretudo por lideranças liberais e comunistas - vejamos quais suas principais balizas narrativas:
- A derrubada do Presidente João Goulart, em 1964, não foi uma “revolução”, tampouco um “movimento em defesa da democracia contra o comunismo”, como afirmavam os militares e a direita civil, mas foi um golpe de Estado conservador, apoiado pelos Estados Unidos no contexto da Guerra Fria.
- O regime instaurado em 1964 seria um regime militar inicialmente “brando” e “transitório”, ou seja, com pouca intensidade repressiva e de caráter intervencionista, exercido por um general moderado – Castelo Branco – mas que se viu pressionado pela “linha dura” da extrema direita militar que queria transformá-lo em uma ditadura permanente e abertamente repressiva. Esse caráter “brando” do projeto golpista original explicaria a relativa liberdade de expressão e debate que ainda havia na sociedade brasileira até o fim de 1968.
- A “linha dura”, aproveitando-se do clima de contestação massiva e de luta armada que se adensava em 1968, conseguiu realizar um “golpe dentro do golpe”, impondo o Ato Institucional n. 5, em dezembro de 1969, instrumento jurídico que visava encobrir uma repressão ainda mais violenta, calcada na censura prévia e na prisão, tortura e extermínio dos opositores. Era o início dos “anos de chumbo” da ditadura, simbolizados sobretudo pelo governo do General Emílio Medici (1969-1974).
- A propaganda oficial, a censura e o sucesso econômico do “milagre brasileiro” criaram um clima de euforia e apoio à ditadura pela classe média, que mascarou a política de contenção salarial dos trabalhadores e o aumento da concentração de renda, facilitando, em termos ideológicos, a dura e violenta repressão aos movimentos de luta armada de esquerda nos “Anos de Chumbo”.
- O general Ernesto Geisel (1974-1979) teria recuperado o “projeto castelista” de moderação política, normalização institucional e transição para um governo civil, iniciando a “Abertura Política” marcada pelo abrandamento da censura à imprensa, pelo controle da repressão paralegal2 e pelo diálogo com o sistema político. A convergência, ainda que conflitiva, entre militares moderados (“castelistas”), movimentos sociais democráticos e oposição liberal teria construído o caminho para a nova democracia brasileira, isolando a linha-dura da extrema-direita militar.
- A conquista da democracia em 1985, com a eleição de Tancredo Neves, foi o ponto de chegada de um longo caminho de resistência pacífica da sociedade civil (sindicatos de trabalhadores, associações de profissionais, grupos católicos progressistas, movimentos sociais de bairro, movimentos artístico-culturais, grupos políticos de oposição, imprensa), mais eficaz do que a ação dos grupos armados de esquerda que, involuntariamente, acabaram justificando o acirramento da repressão no contexto do AI-5.
A Lei de Anistia e a Constituição de 1988 teriam superado a lógica de conflito defendido pela “linha-dura” militar, consolidando a democracia institucional e a “pacificação nacional”.
Essa breve síntese das balizas narrativas da “memória hegemônica”, obviamente, deixa de fora algumas sutilezas e nuances de narrativa histórica perceptíveis dentre os três grandes grupos políticos que a sustentavam: os liberais, os comunistas (sobretudo do PCB, mas também do PC do B3) e a Nova Esquerda reunida em torno do PT. Mais importante para nossa argumentação é perceber que outras memórias ela excluiu e quais as pautas historiográficas que ela orientou.
A consagração de uma memória hegemônica sobre a ditadura brasileira, nos meios de comunicação, na imprensa e nas esferas institucionais, se sobrepôs a outras demandas e narrativas, à direita e à esquerda. A neutralização ideológica destes dois polos na fase de transição democrática (1979-1988) foi fundamental no seu processo de afirmação. Neste sentido, defendo a tese de que essa memória hegemônica é, fundamentalmente, de matriz liberal, embora amplamente disseminada por setores mais à esquerda. A astúcia do discurso liberal de oposição ao regime repousava, precisamente, em sua capacidade de combinar matrizes discursivas opostas, aparar arestas e ampliar a sua circulação no gradiente ideológico da sociedade brasileira. Assim sendo, o regime militar como um todo era lembrado como ilegítimo, violento e autoritário, mas ao mesmo tempo, abrigando governos militares moderados que eram absolvidos no tribunal da história pela memória liberal, como Castelo Branco e Ernesto Geisel, vistos sob o prisma da moderação e sobre os quais não caberia a qualificação de “ditadores”. Nessa mesma lógica narrativa, a sociedade era vista como vítima do autoritarismo e do arbítrio, mas vocacionada para a “resistência”, embora também crítica da violência da esquerda armada.
Em que pese as tensões entre liberais, comunistas e Nova Esquerda, as linhas gerais de memorização do passado ditatorial eram mais ou menos compartilhadas por estes três grupos de oposição. Mas havia algumas nuances e matizes. Para os liberais, a resistência institucional e individual era valorizada. Para os comunistas do PCB, a sociedade civil, os trabalhadores sindicalizados e os intelectuais formadores de opinião foram os principais heróis da resistência. Para a Nova Esquerda, a autêntica resistência democrática era, fundamentalmente, feita pelos movimentos sociais e pela a militância cotidiana nos bairros e fábricas, incluindo aqueles que tinham feito a autocrítica da luta armada e aderido à militância de base.
Outras memórias à esquerda e à direita
Entretanto, havia outros segmentos políticos, à esquerda e à direita, que não se reconheciam nos termos dessa memória hegemônica. As “outras memórias”, entretanto, tiveram que esperar o início do século XXI para irromper de maneira mais contundente no espaço público, como veremos adiante. Dentro dos limites deste texto, gostaria de destacar duas memórias não-hegemônicas que foram ganhando publicidade à medida que a memória hegemônica que havia pautado a transição política foi se desgastando politicamente a partir de 2006, no segundo governo Lula4.
Os grandes derrotados no processo de transição conciliatória impostos pela Lei de Anistia e pela tutela militar foram os movimentos de Direitos Humanos e grupos de familiares de mortos e desaparecidos que, entretanto, persistiram na luta pelo esclarecimento das violações e punições a perpetradores (Teles, 2010). Suas pautas que já apontavam para a tríade “verdade – justiça – reparação”, característicos das justiças de transição, foram inviabilizadas pelos arranjos políticos que marcaram o fim da ditadura. A Lei de Anistia, duramente criticamente por esses movimentos, criou uma barreira político-jurídica constantemente reforçada quando se ousa questionar a impunidade dos perpetradores a serviço da repressão oficial. Ao mesmo tempo, esses grupos tendiam a cultuar a memória positiva dos militantes da luta armada, mortos em ação, sob tortura ou presos, sem recair no discurso da ingenuidade, imaturidade, voluntarismo ou desvio ético-político da opção pela luta armada, típicos das narrativas da “memória hegemônica”. Muitos militantes de Direitos Humanos eram ex-presos ou parentes de presos mortos e desaparecidos, o que implicava em laços políticos e afetivos a um só tempo orientando suas pautas. O argumento central dessa linha de militância era que a impunidade dos perpetradores acabaria por legitimar a violência de Estado paralegal contra a sociedade como um todo, institucionalizando o legado autoritário da ditadura, vitimando principalmente setores mais pobres da população brasileira, tradicionalmente excluídos dos direitos civis e do acesso à justiça (Teles & Safatle, 2010).
A publicação do livro Brasil Nunca Mais, em 1985, foi um marco importante no reforço da luta das organizações de Direitos Humanos que lutavam por uma outra memória – contra o esquecimento dos crimes da ditadura e contra a conciliação forçada da Lei de Anistia. O livro foi produzido a partir de uma grande operação de coleta de informações feita pela Comissão de Justiça e Paz e por advogados de presos políticos com acesso aos processos da Justiça Militar, e serviu como um inventário de horrores das torturas, do caráter criminoso da repressão contra a oposição armada e desarmada, como memorial dos desaparecidos políticos e como denúncia de natureza ética da ditadura, para além da sua rejeição meramente político-ideológica. O livro foi um grande sucesso editorial e reforçou a memória da violência ditatorial em amplos setores da sociedade civil brasileira, constituindo-se em uma espécie de “relatório da verdade” não-oficial, posto que o Estado brasileiro não teve uma Comissão oficial para investigar os crimes da ditadura até 2012. Por outro lado, entidades como a Comissão de Justiça e Paz ligada à Igreja Católica (criada em 1971) e os Grupos “Tortura Nunca Mais” (o primeiro criado no Rio de Janeiro em 1985, como herdeiro dos Comitês de Anistia dos anos 1970) mantiveram o foco na denúncia das violações dos Direitos Humanos pela ditadura militar e na questão dos desaparecidos políticos. Essas entidades elaboraram vários relatórios extraoficiais sobre mortos e desaparecidos, até que o Estado Brasileiro assumisse a tarefa de inventariar os casos de violações de Direitos Humanos, a partir de 2007 (Brasil, 2007), culminando na Criação da Comissão Nacional da Verdade, em 2012.
A nomeação dos mortos e desaparecidos e a manutenção da luta por “verdade-justiça-reparação” por parte destes grupos, minoritários, mas aguerridos, com uma crescente rede de apoio na sociedade civil, acabou por conquistar uma política de memória do Estado brasileiro como resposta às suas demandas. Nesse sentido, foram promulgadas duas leis, em 1995 e 2002, sob o governo de Fernando Henrique Cardoso, um intelectual perseguido e exilado pela ditadura, mas também um político realista e pragmático. A primeira lei reconhecia a responsabilidade do Estado nos desaparecimentos forçados de militantes e os declarava oficialmente “mortos”, permitindo a emissão de certidões de óbitos para as famílias. A segunda, de 2002, ampliava os limites da anistia, permitindo a reivindicação de reparações, sobretudo pecuniárias. Entretanto, ambas as leis evitaram tocar em um ponto central das reivindicações: a investigação sobre as responsabilidades e condições de morte e desaparecimentos de militantes e a revisão da Lei de Anistia de 1979.
Neste sentido, a política de memória do Estado brasileiro, ainda que respondendo às pressões do grupo de Direitos Humanos, criava uma outra fórmula para a justiça de transição. Ao invés da clássica sequência “verdade-justiça-reparação”, tínhamos “reparação”, com alguma verdade, mas nenhuma justiça. As “leis-memória” lançadas sob o governo FHC tentavam conciliar a moderação da memória hegemônica com as demandas dos movimentos de Direitos Humanos e familiares que não se viam contemplados. Apesar de impotentes para reverter a impunidade aos perpetradores, as ações dos grupos de Direitos Humanos, bem como as “leis-memória” do governo FHC, foram suficientes para estimular um backlash da extrema direita civil e militar, saudosa da ditadura e seus métodos.
As reações da extrema direita começaram ainda sob o impacto social da publicação do livro Brasil Nunca Mais, e foram se acirrando à medida que o Estado democrático esboçava novas políticas de memória calcada nos Direitos Humanos e na investigação dos crimes da ditadura.
Entre 1985 e 1986, um grupo de militares ligados à “comunidade de inteligência” elaborou uma longa narrativa contando sua versão particular da luta contra as organizações armadas de esquerda. O projeto foi nomeado de Orvil (“livro” ao contrário), mas sua publicação foi abortada pelo comandante do Exército em acordo com o Presidente da República, José Sarney. Algumas cópias do Orvil, entretanto, foram distribuídas, de maneira reservada, entre militares ligados à “comunidade de inteligência” da ditadura, alimentando narrativas da extrema direita (Figueiredo, 2009). Basicamente, a narrativa do projeto Orvil reitera a versão amplamente difundida nos quartéis de que o golpe de 1964 e a repressão foram respostas legítimas e necessárias contra o chamado “Movimento Comunista Internacional” e seus aliados internos, que visavam “subverter” a ordem “cristã e democrática” e as tradições nacionais, instaurando uma ditadura comunista. Além disso, todas as mortes de guerrilheiros teriam sido ocasionadas por confrontos com as forças de segurança, suicídios e “justiçamentos” da própria esquerda. A narrativa de Orvil nega o uso sistemático de torturas, execuções extrajudiciais e desaparecimentos forçados, e reitera que a origem da violência estava nas ações armadas de esquerda. Tudo somado, trata-se de uma narrativa histórica negacionista, posto que omite ou inverte pontos cruciais para a compreensão dos eventos históricos e da natureza da repressão que utilizou métodos paralegais de maneira sistemática, e não apenas contra a esquerda armada.
Os originais do Projeto Orvil, embora não tenham sido publicados, alimentaram várias outras obras revisionistas e negacionistas5. A mais notória destas narrativas foi escrita pelo Coronel Carlos Brilhante Ustra, comandante do DOI-CODI6 paulista, publicada logo depois que ele foi reconhecido por acaso, por uma antiga prisioneira vítima das torturas ali cometidas, quando era adido militar no Uruguai. O incidente que expôs o ex-comandante ocorreu em 1985, e acabou por manifestar uma fragilidade da máquina de ocultação e cobertura institucional dos torturadores, contribuindo, involuntariamente, para que estas narrativas viessem à luz na forma de livros de memórias dos agentes da repressão. Ao ser exposto de maneira involuntária, quando a então deputada e atriz Beth Mendes em visita oficial ao Uruguai o reconheceu como seu torturador, o coronel Ustra, que então ocupava o cargo de adido militar no país, tornou-se um porta voz da memória dos porões da repressão e partiu novamente para a guerra, desta vez, uma guerra das memórias.
Além dos livros escritos pelo coronel Brilhante Ustra - Rompendo o Silêncio, em 1987, e A Verdade Sufocada, em 2006, houve outras tentativas em transformar esta contra narrativa negacionista em revisionismo historiográfico, mas estas iniciativas editoriais ficaram restritas às publicações independentes custeadas pelos autores ou às editoras ligadas ao exército e ao Clube Militar, tais como o livro A Grande Mentira (2001) do ex-militar Agnaldo Del Nero Augusto (coordenador do projeto Orvil), 2001, publicada pela Bibliex (Biblioteca do Exército), e Editora do Exército. Antes dele, Marco Pollo Giordani publicou Brasil Sempre, em 1986, igualmente baseado no Orvil.
Além disso, o Projeto forneceu a base de conteúdo para o website Ternuma – Terrorismo Nunca Mais, criado em 1998. O uso da internet para propagar as versões da extrema direita foi muito bem-sucedido, mas demonstrava o quanto esses discursos não tinham, até então, acesso à imprensa liberal e a uma circulação mais institucional.
No plano institucional e público, as Forças Armadas, ao menos até o governo Bolsonaro (2019), sempre optaram pelo “silêncio institucional”, reiterando que a Lei de Anistia já tinha resolvido a questão e que não cabia “revanchismos”. Porém, entre setores da oficialidade e da tropa, além do Clube Militar que reúne os militares da reserva, disseminou-se uma memória que ia de encontro à memória hegemônica dominante na sociedade civil, crítica ao regime. Essas vozes militares cobravam uma fala mais contundente na defesa da “revolução” de 1964 e do regime que se seguiu, por parte dos representantes institucionais e altos comandantes militares. Os currículos de Escolas Militares, tampouco, incorporaram a historiografia crítica sobre o período, mantendo ou uma linguagem anódina ou positiva sobre o Golpe e a ditadura (Soares, 2016).
A memória militar não-oficial era claramente ressentida com os setores civis que renegaram suas “ligações perigosas” e seu apoio aos militares em 1964 e no combate à luta armada. Muitos setores civis, como a classe média e o empresariado, foram beneficiados pelo regime e, desde o seu fim, posavam como “heróis da resistência democrática”. Na autorrepresentação dos militares, as Forças Armadas tinham salvado o país do comunismo, da corrupção e, acima de tudo, incrementado a economia brasileira, e nunca tinham sido reconhecidas. No máximo, essa narrativa saudosista admitia alguns “excessos” no combate à “subversão”, mas nada que desviasse o país da sua tradição “cristã, ocidental e democrática”.
Essa memória militar extremista estava limitada, ao menos até meados da primeira década do século XXI, a núcleos sociais restritos e websites de extrema direita, sem maiores impactos na esfera pública. Na sociedade brasileira, predominavam ou as narrativas hegemônicas consagradas, críticas ao regime (reiteradas nos manuais escolares, artes, movimentos sociais e espaços institucionais) ou o simples desinteresse do cidadão não-politizado, diante do passado histórico, mesmo entre setores da classe média escolarizada. Entretanto, havia indícios de uma memória privada, pouco articulada, quase subterrânea, transmitida no interior das famílias conservadoras, que era claramente nostálgica em relação à ditadura. Nesta linha de rememoração privada, a ditadura havia sido uma época de crescimento econômico, ausência de corrupção e baixa criminalidade, em contraste com o período democrático posterior que apresentava grande dificuldade na área econômica, baixa moralidade pública e falta de segurança pública. Obviamente, trata-se de uma memória que se apropria seletivamente do fatos da história, pois o período da ditadura também foi marcado por grave crise econômica (à exceção dos anos do “Milagre”), aumento da criminalidade urbana e episódios de corrupção sempre encobertos pela censura. Mas isso não abalava a memória privada que circulava pela sociedade brasileira e pouco era confrontada por setores progressistas, vista como residual e até um tanto bizarra. Essa forma de lembrar do período revela o apoio social a soluções autoritárias, engendrando uma “memória nostálgica” da ditadura, mas foi pouco pesquisada pela historiografia brasileira até o início do século XXI, dada a dificuldade das fontes (Reis Filho, 2000; Cordeiro, 2015).
Essa memória social positiva da ditadura apoiava-se na frágil cultura de Direitos Humanos no Brasil, que tem uma circulação restrita no conjunto da sociedade brasileira, assolada por uma grande violência social e policial. Na cultura popular de massa, alimentada por comunicadores de direita, o “pessoal dos Direitos Humanos” era desqualificado como “defensores de bandidos” sanguinários, sabotando e criticando as ações policiais. Em grande parte, esses discursos contra os Direitos Humanos eram marcados pelo ódio de classe e por preconceitos raciais velados, que circulavam nos meios de comunicação populares (sobretudo, programas policiais de rádio e TV e websites de internet), retroalimentados pela própria violência dos criminosos contra o cidadão comum que se via desprotegido pelo Estado. Essa cultura de violência, social e policial, acabou por minar a possibilidade de crescimento de uma cultura de Direitos Humanos no Brasil pós-ditadura sob o olhar, por um lado, impotente dos governos democráticos e, por outro, conivente de setores conservadores que ocupavam postos institucionais no sistema judiciário e policial (Manso, 2012).
Apesar disso, o Brasil parecia ter consolidado sua democracia institucional e a cena política era dominada por dois partidos – PT e PSDB - que, cada qual ao seu modo, eram herdeiros da resistência antiditatorial. Ambos incorporavam o discurso genérico dos Direitos Humanos e as pautas geradas pelos grupos ativistas nesta área, embora pouco fizessem para mudar a realidade da violência policial e a ação paralegal de grupos de extermínio ligados à polícia, herdeiros da violência da ditadura. A bem da verdade, o sistema federativo brasileiro reservava a questão da segurança pública a governos estaduais, alguns deles conservadores e comandados por quadros oriundos da ditadura. O discurso democrático dos políticos pouco se refletia em políticas contundentes de promoção de Direitos Humanos, reforma policial, renovação das práticas judiciais e ações educativas que, efetivamente, afirmassem a democracia e os direitos civis como balizas da questão da segurança pública. Nesta área, diga-se, a direita e a extrema-direita sempre deram o tom das políticas públicas, em que pese os esforços de renovação por parte de alguns gestores das polícias, do sistema político e do sistema jurídico.
Intervenção do coletivo “Paulestinos” em formato de cartaz colado em via pública, São Paulo, 2019 (“lambe-lambe”).
A crise da memória hegemônica
Até o início do segundo governo Luís Inácio Lula da Silva (2006), os enquadramentos da memória social sobre a ditadura brasileira claramente indicavam a preponderância de um discurso público crítico, mas igualmente conciliatório, ao qual caracterizei como “memória hegemônica”, com algumas tensões internas protagonizadas pelos seus fiadores políticos, mas claramente dominante na sua condenação peremptória ao golpe de 1964 e à ditadura. As vozes da extrema direita soavam como bizarras no seu negacionismo, e as memórias privadas nostálgicas ao regime pareciam não ter força para alimentar uma militância política. Algumas demandas dos grupos de Direitos Humanos eram incorporadas pelas políticas de Estado que se pautavam pela memória hegemônica, mas a Lei de Anistia e a impunidade aos torturadores era o limite que não podia ser ultrapassado. Assim se equilibravam as coisas.
Entretanto, esse equilíbrio dava sinais crescentes de desgaste, à medida em que liberais encastelados em associações civis, na imprensa e nos meios de comunicação aumentavam o tom do antipetismo e anti-esquerdismo como forma de desgastar o governo Lula, já abalado por episódios de corrupção e criticado por setores da esquerda pelo seu estilo conciliador e moderado.
O encontro paulatino entre a militância da extrema direita civil e militar e a memória popular nostálgica do autoritarismo foi sendo alimentado pela crise interna na memória hegemônica, à medida que as disputas políticas entre liberais e petistas ao longo do segundo governo Luta abriram espaço para um “revisionismo ideológico” da direita liberal que, embora mantivesse o discurso crítico em relação à ditadura, à censura e à tortura, passou a destacar as responsabilidades da esquerda (trabalhista e comunista) pela crise que culminou no golpe de Estado de 1964 e denunciar a violência das organizações armadas, sugerindo certa equivalência com a violência da ditadura. A entrada no debate brasileiro da “Teoria dos Dois Demônios”, primeiro de maneira sutil, depois escancarada, foi uma das expressões dessa fissura na memória hegemônica que só aumentaria entre 2007 e 2015, acompanhando o antipetismo crescente dos liberais brasileiros7. Esta fissura acabou por criar o contexto propício não apenas para que os negacionistas e ativistas da extrema direita saíssem de seus nichos sociais e ganhassem a esfera pública, reclamando para si o direito a uma outra narrativa sobre a ditadura, oprimida pelas “mentiras da esquerda” e de historiadores “parciais e engajados”. Dito de maneira mais simplista, o revisionismo liberal, sobretudo na imprensa, acabou por abrir a porta para o negacionismo da extrema direita, abalando os termos da memória hegemônica que tinha afiançado a transição e a consolidação da nova democracia brasileira (Napolitano, 2021; Napolitano, 2022).
Em 2007, o III Plano Nacional de Direitos Humanos tentou avançar no campo do “direito à memória e à verdade”, estimulando um verdadeiro boom de memória crítica sobre o regime militar. Nesse contexto, emergiram vozes que enunciaram uma perspectiva traumática sobre as experiências da violência de Estado no Brasil, problematizando o seu recalque histórico e seus efeitos traumáticos gerados no processo de transição política orientada para o futuro. O “passado que não passa” emergiu com toda a força na forma de livros de memória, memoriais, filmes documentais e livros de ficção que expressavam subjetividades e experiências que não cabiam nas memórias hegemônicas institucionalizadas8. As acomodações e conciliações de uma memória liberal apaziguada da ditadura que pautou o processo de transição, equilibrando-se entre a crítica genérica e o esquecimento seletivo, passavam a ser criticadas também pela esquerda. As suas ações não se limitaram ao campo simbólico ou cultural. Em 2010, a tentativa de revisão constitucional da Lei de Anistia com base em uma Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) impetrada pela Ordem dos Advogados do Brasil foi barrada no Supremo Tribunal Federal. Na percepção dos ministros da Suprema Corte brasileira, a Lei de Anistia não era inconstitucional. O voto do ministro Gilmar Mendes é exemplar de uma certa memória liberal conciliatória que condena a ditadura, mas sanciona a transição democrática tutelada pelos militares. Na sua visão, a Lei de Anistia tinha sido legítima, posto que discutida e votada no Congresso sem as amarras do AI-5 (extinto no final de 1978), e que não era incompatível com a Constituição de 1988, elaborada por uma Assembleia Constituinte convocada com base em leis vigentes durante a ditadura. Ao fim, Gilmar Mendes elogiava a resistência da sociedade brasileira que tinha conquistado a lei dentro de uma tradição jurídica que evitava ruptura e “refazimentos” institucionais9.
A instauração da Comissão Nacional da Verdade, em 2012, que finalmente preencheria a lacuna de um relatório oficial do Estado brasileiro sobre a ditadura militar, ocorreu em meio a esse cenário de fissuras na memória hegemônica que até então sustentara as bases simbólicas da democracia brasileira. As faturas positivas da CNV não foram poucas, embora a historiografia acadêmica brasileira já tivesse elucidado e aprofundado muitos temas obscuros daquele passado (Motta, 2021), com acesso a parte importante da documentação histórica. A CNV pôde avançar na investigação das violações aos direitos humanos, nas circunstâncias das mortes e desaparecimentos, sua cadeia de responsabilidades, além de reconstituir a rede de apoio ao regime, os lugares de perpetração e, talvez sua grande fatura, as violências do regime contra populações indígenas e camponesas. Além disso, estimulou dezenas de comissões da verdade estaduais e institucionais pelo Brasil afora, que produziram uma massa considerável de documentos e informações sobre os efeitos locais e setoriais da ditadura brasileira (Hollanda & Israel, 2019). O crescimento de movimentos sociais antirracistas na cena pública brasileira também propiciou a construção de uma nova perspectiva sobre a violência de Estado, articulando a violência policial do presente ao modelo de segurança pública consagrado na ditadura (Manso, 2012).
O levante social de 2013, “contra tudo que está aí”, mas que acabou desgastando muito mais o Partido dos Trabalhadores no poder desde 2003, permitiu que grupos de direita tomassem as ruas, ainda sem a hegemonia absoluta que seria vista nas passeatas organizadas entre 2015 e 2016, que culminaram no golpe parlamentar contra a presidenta Dilma Rousseff. Em outros campos da sociedade, as propostas e perspectivas da direita também ganhavam espaço, como por exemplo, a tentativa de cercear o ensino de história e de outras disciplinas a partir de uma pauta conservadora, pelo movimento autointitulado Escola sem Partido.
Involuntariamente, a ação da CNV e o relatório apresentado no final de 2014, mesmo não tendo poder de punição aos perpetradores com base em processos judiciais, provocaram uma forte reação de setores das Forças Armadas10. A mera exposição pública dos perpetradores e a percepção de um avanço na investigação dos crimes da ditadura acabaram por aproximar os militares moderados que defendiam o “esquecimento institucional” e as vozes institucionais ressentidas dos setores da extrema direita militar (e civil). Neste clima, Jair Bolsonaro, então um exótico deputado de extrema direita do “baixo clero”, pôde dedicar seu voto pelo impeachment de Dilma Rousseff, sem maiores consequências políticas, morais ou jurídicas, a Carlos Brilhante Ustra, o já mencionado chefe do DOI-CODI paulista e acusado de torturas durante a ditadura.
O negacionismo também ganhava o espaço público, e seria um dos temas das eleições presidenciais de 2018, quando foi um dos pilares da bem-sucedida campanha presidencial de Bolsonaro ao Palácio do Planalto. Não apenas a verdade histórica da ditadura seria ameaçada, mas vários outros passados sensíveis, como a colonização, a escravidão e o genocídio indígena também foram questionados pela extrema-direita11.
O quadro atual do processo memorial brasileiro em relação à ditadura, no ano em que o Brasil nação completa 200 anos e que vê se aproximar o contexto de uma decisiva eleição presidencial, assiste uma tensão crescente entre a memória revisionista e negacionista da ditadura e a ação pública de historiadores e movimentos sociais em defesa do conhecimento histórico pautado pela ética da verdade e pela epistemologia crítica. A compreensão de que o negacionismo não é uma mera opinião, ou mera narrativa memorialística de natureza identitária, mas um movimento organizado para produzir mentiras sistemáticas e apagar responsabilidades políticas e jurídicas sobre os crimes e violências do passado é crucial para este novo combate pela história e pela memória. Ambas, mesmo não se confundindo, devem interagir em um ambiente democrático e de livre-opinião que não falseie o passado para encobrir responsabilidades sobre as violências e violações aos Direitos Humanos perpetradas em nome da ordem social e da segurança. Se a verdade histórica é sempre difícil de ser identificada para além de uma matriz factual básica, estudada a partir de fontes primárias, sobre as quais devem repousar as interpretações e debates, o seu oposto, a mentira sistemática do negacionismo, não pode ser objeto de dúvidas em nome de uma suposta liberdade de opinião.
Os processos memoriais, do Brasil e de outros países que tentam acertar as contas com seus passados sensíveis, influenciam diretamente as pautas historiográficas e a busca por um conhecimento mais objetivo que exponha os mecanismos de violências e o autoritarismo desses passados. Ambas, memória e história, são fundamentais para a consolidação das democracias, posto que por caminhos epistemológicos diferenciados ajudam a combater o negacionismo e purgar as violências do passado, para que elas não continuem se reproduzindo no presente.
Notes
1
A “memória hegemônica” pode ser definida como a narrativa sobre o passado que predomina na esfera pública, instituições político-jurídicas, imprensa, movimentos sociais, sistema artístico e sistema escolar de uma sociedade. Pode haver variáveis ideológicas entre estas instituições diversas, mas a tendência é ficar preservado um núcleo valorativo e ético para dar sentido social aos eventos que pautam a narrativa (Napolitano, 2015). É preciso não confundir automaticamente “memória hegemônica” com “história oficial” (chancelada pelo Estado, imposta ao sistema escolar e compartilhada pelas elites dominantes), nem com “memória da maioria”.
2
Embora Geisel tenha exonerado o comandante do II Exército depois da morte sob tortura do operário e militante comunista Manuel Fiel Filho, em 1976, consolidando sua autoridade sobre os serviços de inteligência do regime, não se pode afirmar que seu governo tenha sido pautado pelo respeito mínimo aos Direitos Humanos. Desde sua posse, em março de 1974, até fins de 1975, as forças de repressão mataram dezenas de opositores. O montante de desaparecidos políticos também aumentou em seu início de mandato.
3
O Partido Comunista do Brasil (PC do B) surgiu de uma dissidência do PCB, em 1962, como desdobramento dos processos de alinhamento deste com as novas diretrizes teóricas surgidas pela crítica ao Stalinismo na União Soviética e com as novas políticas aliancistas da Declaração de Março de 1958. Depois do golpe de 1964, o PC do B tentou organizar uma guerrilha rural, na linha maoísta, na região do Araguaia. Em fins dos anos 1970, após a derrota desta experiência, o partido passou a combinar forte militância nos bairros e movimentos sociais, com a defesa de uma política de frente em torno do Movimento Democrático Brasileiro (MDB).
4
Entre 1994 e 2014, a política nacional brasileira foi monopolizada pelas disputas entre o Partido da Social-Democracia Brasileira (PSDB), de centro-direita, e o Partido dos Trabalhadores (PT), de centro-esquerda. Ambos tinham sido criados nos anos 1980, e se viam como herdeiros da resistência democrática, com o PSDB tendo sua base social na classe média das grandes cidades, e o PT nos movimentos sociais e nos sindicatos.
5
A categoria “revisionismo”, tal como citada neste artigo, deve ser compreendida como uma perspectiva de distorção programática e intencional de eventos e processos históricos, mais sutil, entretanto, do que o “negacionismo” antifactual. Ambos visam encobrir responsabilidades históricas e políticas em processos de violência massiva e violação de direitos humanos, mas o fazem mediante estratégias diferenciadas entre si. Esse “revisionismo ideológico” tampouco deve ser confundido com a revisão historiográfica, posto que não respeita as regras metodológicas básicas da pesquisa histórica, além de fazer uso frequente e proposital do anacronismo. Ver Napolitano, 2022.
6
O sistema de Destacamentos de Operações de Informações-Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-CODI), criado em 1970, era o centro da repressão política durante a ditadura militar brasileira, conectando-se e articulando outros órgãos de repressão política das polícias e das Forças Armadas. Havia vários DOI-CODIs espalhados pelo território nacional, sempre subordinados a um comando militar institucional, mas com grande flexibilidade operacional para conduzir suas ações repressivas.
7
Vale recordar que a narrativa conhecida como “Teoria dos Dois Demônios” surgiu no contexto da transição argentina, e procurava explicar a “guerra suja” e a ditadura militar como o resultado de duas facções igualmente violentas, os militares perpetradores e suas “patotas” e os agrupamentos guerrilheiros de esquerda (Franco, 2015). Entretanto, as reações dos movimentos de direitos humanos e a comoção social causada pelos juicios ainda em 1985 dissiparam a adesão social desta tese. No caso brasileiro, a crítica à luta armada, entre o fim dos anos 1970 e início dos anos 2000, não se utilizou da figura dos “dois demônios”. Em nenhum momento, a violência da guerrilha era considerada como equivalente aos torturadores a serviço do regime. No início dos anos 2000, a influente coleção sobre a história da ditadura escrita pelo jornalista Elio Gaspari, a partir do acervo documental dos generais Ernesto Geisel e Golbery do Couto e Silva, o maior estrategista político do regime, abriu espaço para responsabilizar as imposturas da esquerda pelo golpe e pelo fechamento político de 1968, embora o tom da obra fosse crítico à ditadura. Em 2014, o historiador Marco Antônio Villa publicou outro livro – Ditadura à brasileira – culpando a esquerda e a direita pela irrupção do golpe e o recrudescimento da ditadura, um dos exemplos do que nomeio neste artigo como “revisionismo ideológico liberal”.
8
Exemplares desta nova perspectiva acerca de uma memória traumática da ditadura são: o livro K – Relato de uma busca, de Bernardo Kucinski (Expressão Popular, 2011) e o documentário Diário de uma busca de Flávia Castro (2011). Em ambos, as narrativas – literária e audiovisual, respectivamente – são truncadas, elípticas, lacunares. O passado traumático impede uma memória heroica, apaziguada e reflexiva sobre o período, tal como se manifestava nas balizas da memória hegemônica.
9
O texto integral do voto do Ministro Gilmar Mendes pode ser lido em conjur.com.br
10
Dentre as reações dos militares à criação e atuação da CNV, destaco o Manifesto dos Clubes Militares de 16/02/2012, criticando as manifestações de membros do governo em homenagem aos que lutaram contra o regime, instando a Presidenta Dilma a desautorizar seus subordinados. A reação ao Manifesto, por parte do governo, desencadeou um abaixo-assinado de militares da reserva em apoio aos clubes militares. Em setembro de 2014, um manifesto de 27 generais da reserva, incluindo o próprio general Leônidas Pires, primeiro comandante do Exército pós-ditadura, criticou duramente as ações da CNV e recusou qualquer possibilidade de pedidos de “desculpas” por parte das Forças Armadas apontadas como responsáveis pelas violações de Direitos Humanos durante o regime.
11
Foge aos limites deste artigo discutir, teoricamente, o conceito de “verdade histórica”. De todo modo, a luta contra o negacionismo histórico pressupõe uma matriz factual sobre ações que no passado envolveram vítimas e perpetradores, além de se apoiar em conceitos que permitam analisar criticamente o sentido e as responsabilidades sobre ações políticas que incrementaram a violência e o conflito.
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